Certa noite, no fim de 1979, um jovem físico itinerante chamado Alan
Guth, com um filho recém-nascido e um emprego de um ano em Stanford,
ficou acordado até tarde com um caderno cheio de equações, se
aventurando muito além do universo da Física conhecida.
Ele
tentava entender porque não havia traços de partículas exóticas que
deveriam ter sido criadas durante o Big Bang. Ao invés disso, ele
descobriu o que pode ter sido a fonte do bang universal para começo de
conversa. Um possível defeito no provável trajeto da evolução cósmica
poderia ter enchido o espaço todo com um tipo especial de energia que
gerava uma força de repulsão, levando o universo a crescer mais rápido
que a velocidade da luz por um instante prodigiosamente violento.
Se
isso fosse verdade, o crescimento rápido resolveria paradoxos como
porque o céu parece uniforme de polo a polo, e não como uma bagunça
irregular e desordenada. O aumento repentino acabaria com todas as rugas
e irregularidades. Essas partículas não estariam desaparecidas, mas
teriam sido diluídas a ponto de não ser mais possível detectá-las.
"CONCLUSÃO ESPETACULAR", escreveu Guth no topo da página e traçou duas caixas em torno da frase.
Em
março, a espaçonave de Guth retornou. Radioastrônomos relataram terem
visto o início do Big Bang, e que sua hipótese, que tem o nome pouco
dramático de inflação, parecia estar certa.
Observando os
primeiros momentos do tempo cósmico, há 13,8 bilhões de anos, com
telescópios instalados no Polo Sul, Uma equipe de astrônomos liderada
por John M. Kovac, do Centro Harvard-Smithsonian de Astrofísica,
detectaram ondulações no tecido do espaço-tempo – conhecidas como ondas
gravitacionais –, que sinalizam que o universo estava sendo esticado com
violência quando tinha apenas o trilhonésimo de um trilhonésimo de um
trilhonésimo de segundo de idade. Essas são as evidências da inflação
que eram buscadas há muito tempo, comprovando, segundo Kovac e seus
colegas, que Guth estava certo.
A teoria da inflação tem
orientado os trabalhos da área de cosmologia há 35 anos, embora muitas
pessoas, incluindo Guth, se questionaram se ela poderia ser provada.
Caso
seja corroborado, o trabalho de Kovac será um marco na história da
Ciência comparável à descoberta recente da matéria negra que afasta cada
vez mais os limites do universo, ou ao próprio Big Bang. Isso abriria
grandes áreas do tempo, do espaço e da energia para a Ciência e a
especulação.
Confirmar a teoria da inflação significaria que o
universo visível, que se espalha por 14 bilhões de anos luz no espaço,
com suas centenas de bilhões de galáxias, é apenas uma parcela
infinitesimal de um cosmos muito maior, cuja extensão, arquitetura e
destino são grandes demais para a compreensão humana. Mais do que isso,
além de nosso próprio universo, podem existir incontáveis outros
universos borbulhando na espuma da eternidade, como a água que escorre
da panela de macarrão.
Em nosso universo, isso serviria como uma
janela com vista para as forças que operam as energias que sempre
estarão além do alcance dos aceleradores de partículas terrestres, além
de fornecer novas ideias sobre a própria gravidade. As ondulações de
Kovac seriam a primeira observação direta de ondas gravitacionais, que,
de acordo com a teoria geral da relatividade de Albert Einstein,
estariam por toda a superfície do tempo-espaço.
Marc
Kamionkowski da Universidade Johns Hopkins, um especialista nos
primórdios do universo que não fez parte da equipe, afirmou: — Essa é
uma tremenda descoberta. Não dá para ser maior que isso.
—
Embora eu talvez não seja capaz de compreendê-la totalmente, esse é um
sinal enviado dos primeiros momentos do universo, um telegrama escondido
nas ondas gravitacionais, afirmou Kamionkowski.
As ondulações
se manifestam na forma de pequenos padrões espiralados em um banho de
radiação de micro-ondas que permeia o espaço e conserva a imagem de
quando o universo tinha apenas 380.000 anos e era tão quente quanto a
superfície do Sol.
Kovac e seus colaboradores – parte de um
experimento chamado Imaginologia de Fundo da Polarização Cósmica
Extragaláctica, ou BICEP, na sigla em inglês – relataram seus resultados
em um comunicado feito à comunidade científica no Centro de Astrofísica
de Cambridge, e em uma série de artigos enviados à revista The
Astrophysical Journal.
Kovac afirmou que a chance de que os resultados estejam errados é de apenas uma em 10 milhões.
Guth,
67 anos, afirmou ter tirado o chapéu, comentando que não esperava uma
confirmação tão definitiva de sua teoria antes de morrer.
— Com a natureza, é preciso ter sorte. Aparentemente fomos sortudos desta vez.
Os
resultados são a destilação de três anos de observações e análises.
Evitando usar e-mail por medo de que suas informações vazassem, Kovac
entregou pessoalmente esboços do trabalho para um pequeno grupo de
escolhidos, encontrando-se com Guth, que é professor do Massachusetts
Institute of Technology, em seu escritório.
— Este é um momento muito especial, e todos nós cientistas compreendemos sua seriedade, afirmou Kovac.
À
medida que as mídias sociais se enchiam de rumores de que a inflação
havia sido testemunhada e as notícias se espalharam, os astrofísicos
reagiram com um misto de júbilo e cautela.
John E. Carlstrom da
Universidade de Chicago, mentor de Kovac e diretor de um projeto
concorrente chamado South Pole Telescope, afirmou estar profundamente
impressionado. "Acredito que os resultados são lindos e muito
convincentes", afirmou.
Paul J. Steinhardt de Princeton, autor
de uma teoria que concorre com a inflação e defende o choque de dois
universos como a causa da gênese, afirmou que se isso for verdade, o
resultado do BICEP eliminaria seu modelo, mas, ainda assim, expressou
reservas em relação à teoria da inflação.
Lawrence M. Krauss da
Universidade Estadual do Arizona, e outros cientistas enfatizaram a
necessidade da confirmação, destacando que os novos resultados excedem
estimativas anteriores baseadas em mapas de temperatura do pano de fundo
cósmico feitos pelo satélite Planck, da Agência Espacial Europeia, além
de outros pressupostos em relação ao universo.
— Por isso, precisamos esperar para ver, antes de começarmos a pular de alegria, afirmou Krauss.
A
corroboração pode não demorar a sair. A espaçonave Plack, que tem feito
análises excepcionais das micro-ondas do Big Bang, relatarão as
descobertas ainda este ano. Ao menos uma dúzia de outras equipes estão
usando balões, montanhas e o espaço para obter informações similares.